Quase todo jornalista um dia sonhou em publicar um livro. Nosso blogueiro Fernando Neves sonhava. Ele passou por redações da grande imprensa, como Jornal da Tarde, Jornal do Brasil e Isto É Dinheiro. Hoje, está à frente da Argonautas Comunicação & Design, empresa que criou ao lado da mulher, Flavia. Os dois são pais de lindas gêmeas de um ano e oito meses.
Com tantas atividades, ele encontrou tempo para resgatar seu antigo sonho. Numa só tacada publicou dois livros: um romance policial sobre São Paulo e uma peça medieval que narra o diálogo de duas princesas. “Escrevi entre uma troca de fralda e um soninho da tarde, ou naquela horinha depois do almoço durante a semana”, brinca.
O mais interessante foi o que o motivou: sem grana para bancar a publicação ou paciência para esperar o processo às vezes longo de aprovação em editoras, ele mostrou os dois textos a pessoas próximas e mandou ver no sistema eletrônico de publicação do Kindle. “Sem burocracia, sem aprovação de editores.”
Um belo exemplo de como o meio digital vem revolucionando profissões como as de jornalista e escritor, facilitando a expressão dos autores e abrindo um leque diverso de opções aos leitores. Leia a entrevista abaixo.
Como foi a ideia de publicar via Kindle? Pode explicar como funciona?
Foi por acaso. Como não tenho dinheiro para publicar o livro físico, afinal sou pai há pouco tempo de filhas gêmeas, pensava em uma alternativa eletrônica. O Kindle surgiu porque minha mãe ganhou um e ficou fascinada. Um dia entrei no site da Amazon, que fala especificamente sobre o produto e, para minha surpresa, ao pé da página, lá estava o link convidativo: “Ganhe dinheiro conosco”. Cliquei e descobri que é bem fácil e autoexplicativo. Chama-se Kindle Diretcly Publishing e nada mais é que um sistema eletrônico de publicação direta de livros. Sem burocracia, sem aprovação de editores. Nada. Simples e direto. Agora, tradução é algo que você faz. Por isso, nesse momento estou iniciando o processo de traduzir meus dois livros para o inglês.
Você pode ganhar dinheiro com isso?
A grana entra com a venda dos livros, quando recebo 35% de direito autoral. O percentual e o valor de capa deles sou eu quem estipula, a Amazon não se intromete.
A temática dos livros – um policial e uma peça medieval – é bem diferente. Mas têm em comum uma coisa: histórias com um pé na História. Você sempre gostou de ler sobre história? Desde quando escreve?
Sempre li sobre história, em especial história contemporânea do Brasil. Conversava com as pessoas sobre os fatos que elas vivenciaram. Por exemplo, uma vez perguntei à minha avó como tinha sido a chegada do zepelim ao Rio de Janeiro, afinal ela viu isso acontecer. Gosto também de ver fotos antigas para identificar fatos ou aspectos históricos que permitam datar a imagem. Bom , o livro de ficção policial chama-se “Homens de maior fé” e fala de duas histórias em paralelo: a campanha para prefeito e um grupo de extermínio dentro da polícia militar de São Paulo. A peça de teatro se chama “Joana e Berengária” e narra a conversa entre duas princesas medievais na cabine de um navio entre a Sicília e o Oriente Médio. Faz alguns anos que surgiram os romances históricos, se não me falha a memória o gênero ganhou força no final dos anos 60. E o interessante é que são histórias reais, mas romanceadas, o que dá sempre um molho a mais e atrai bastante. Olha, a primeira vez que eu escrevi algo que alguém disse “isso é bom”, eu tinha 12 para 13 anos e foi uma redação na escola. Ou melhor, era para ser uma redação, mas se tornou um micro conto infantil. Minha mãe pegou o texto e levou para um cara que era redator publicitário na agência onde ela trabalhava. O cara que disse “isso é bom” foi Orígenes Lessa, que entendia muito do riscado.
Você é pai de gêmeas de um ano e meio, toca uma empresa de comunicação: como ainda encontra tempo
para se dedicar a literatura?
Está escrito: quem não faz nada reclama que não tem tempo. (Escrevi) Entre uma troca de fralda e um soninho da tarde, ou naquela horinha depois do almoço durante a semana…
O Kindle chegou para ficar? Como você enxerga o futuro do mercado editorial. Está na Internet?
Não sou especialista nisso. Acho que o Kindle e os demais leitores eletrônicos chegaram sim para ficar. Mas o livro impresso não será banido. Não por causa daquela coisa boba de “cheirinho de papel”, que é uma imbecilidade. O livro ficará por vários fatores. Primeiro, porque há ainda muita gente que não se sente confortável com o dispositivo eletrônico e não tem nada a ver com idade, ok? Minha mãe tem 74 anos e é craque no Kindle. Segundo, porque o mercado editorial tradicional é forte ainda, o que é muito bom porque gera emprego, receitas etc e tal. Terceiro, porque ainda não há uma solução para a estante de livros. Vou explicar. Quando um amigo vai à minha casa ele corre os olhos pela estante para ver os livros que tenho. Gosto de exibi-los como toda pessoa que tem estante de livros. O livro eletrônico ainda não tem solução semelhante para essa saudável exibição intelectual. Será que o caminho é projeção em 3D das capas? Um holograma rotativo com as imagens das capas? Porque com a redução do tamanho dos apartamentos é complicado imaginar grandes estantes para livros. A solução com certeza virá.
O livro analógico é comprado na livraria ou nas bancas de jornal. Já o digital é baixado no Amazon. Como você controla a receptividade do público? Você tem uma troca com seus leitores?
Estou começando. então não dá para saber nada de receptividade, ok? Mas qual a receptividade que o autor tradicional tem? Sinceramente, só o que ele lê das críticas. Ninguém é capaz de dizer “meu leitores gostaram”. Ele afirma isso pelo volume de vendas. O que, se pensar bem, não é garantia de aprovação pelos leitores. Pode ser só resultado de uma boa campanha de divulgação ou de um modismo. E, claro, também pode ser porque tem qualidade mesmo e um contou para o outro. Veja, a diversidade de títulos nas boas casas do ramo é maravilhosa, mas sinceramente, para o autor iniciante, ele precisa contar com a sorte ou sua fada madrinha para ser achado. Nem estou levando em conta que podem haver mil empecilhos para o iniciante nas grandes casas do ramo. Agora, com o eletrônico na Amazon é diferente. Pensa bem. De repente, eu, que não sou conhecido, coloquei dois livros somente no maior distribuidor de livros eletrônicos dos Estados Unidos. Vou verter para o inglês e eles vão me colocar à disposição dos leitores deles em todos os países que consomem livros em língua inglesa. Não é pouca coisa.
Já publicou uma peça e um policial. O que vem pela frente?
Tem mais um de ficção, dessa vez passado no Rio de Janeiro. Outro policial passado em São Paulo com alguns personagens do “Homens de maior fé”, mas cronologicamente anterior. E um de contos. Está bom assim, né?
Leia aqui os livros: Homens de maior fé e Joana e Berengária
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