A economia brasileira vive numa espiral descendente há pelo menos três anos. Desde meados de 2013 começaram a pipocar, aqui e ali, sinais de que nem a situação na época, tampouco o cenário futuro se assemelhavam ao mar róseo pintado pelos técnicos do governo federal. Aliás, a leitura mais acurada das estatísticas e dados oficiais (IBGE, IPEA, Secex e Banco Central) já desnudavam que teríamos pela frente um ciclo de muitos problemas.
Foi neste contexto que conversei com Thierry Fournier, o recém-empossado presidente da subsidiária Brasil, Argentina e Chile da gigante francesa Saint Gobain, um grupo que comanda negócios na produção e distribuição de materiais de construção. Na época, eu atuava como editor-assistente de negócios e colunista de sustentabilidade da revista IstoÉ DINHEIRO.
Durante o papo, o executivo traçou um retrato realista da economia brasileira e da América Latina, em geral. Mas seu semblante não era de preocupação. Ao contrário. Ele estava muito animado em seu trabalho num mercado pujante, como o Brasil, com uma população de 210 milhões de pessoas, e no qual vislumbrava, ainda, inúmeras oportunidades de crescimento. Não apenas para a empresa, como também para sua carreira profissional.
Há cerca de duas semanas, reencontrei Fournier. Desta vez, não foi na sede da empresa, no bairro da Água Branca, na cidade de São Paulo. Mas sim na “tórrida” Capivari, distante cerca de 100 quilômetros da capital do estado. Aliás, estavam ele, o diretor de pesquisas da filial, Paul Houang, além uma penca de executivos do grupo e autoridades governamentais de São Paulo. Mas quem chamava a atenção no grupo era Pierre-André de Chalendar, presidente mundial do Grupo Saint Gobain.
O encontro marcou a inauguração do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento da empresa. Trata-se do oitavo do gênero erguido pelo conglomerado francês e o primeiro no hemisfério sul.
Fé no Brasil
“Nossa fé no Brasil continua inabalada”, disse de Chalendar, em entrevista aos jornalistas presentes ao evento. E não se trata de exagero. Com o centro, que consumiu R$ 55 milhões, incluindo recursos de incentivos fiscais oriundos da Lei do Bem, a empresa poderá desenvolver materiais sob medida para o mercado local. “Agora poderemos realizar testes e trabalhar de forma transversal, atendendo a todas as empresas do grupo”, destacou Houang. “Mais que tropicalizar os produtos, poderemos fazer ensaios com novos materiais, incluindo aqueles existentes apenas no Brasil.”
A unidade será a ponta-de-lança de uma ambiciosa estratégia de liderar os projetos de construções sustentáveis e obras limpas, no Brasil. Aliás, Houang garante que o prédio já se impõe como o mais sustentável do Brasil, levando-se em conta economia e energia, conforto térmico e e aproveitamento da água. “Queremos fazer pesquisas que privilegiem, também, a reciclagem e o reaproveitamento de insumos gerados nas obras.”
Mas as apostas da Saint Gobain no Brasil não têm se limitado ao futuro, nem apenas a nichos de mercado. Nos últimos dois anos, a empresa tem feito aquisições importantes por aqui. Desde de sua posse, em setembro de 2014, Fournier vem esquadrinhando o mercado em busca de oportunidades de negócios. Somente neste ano foram três aquisições no Rio Grande do Norte, em São Paulo e no Rio Grande do Sul: Industrial Potengy, dona da marca Fortcola, de argamassas, SG Plásticos, do segmento de tubos, e a Poli Tape, fabricante de fitas adesivas no Brasil. Este movimento assume uma importância ainda maior quando lembramos que, em 2014, houve apenas a aquisição da British, fabricante de abrasivos não-tecidos baseada em Indaiatuba (SP).
Mas nem tudo é notícia boa. A situação delicada da economia brasileira, contudo, vem se refletindo no balanço da empresa. No ano passado, as vendas fecharam em R$ 8,7 bilhões, número significativamente menor que o apurado em 2014: R$ 9,8 bilhões. Mas nada capaz de abalar o otimismo francês. “Já dei carta branca à filial para analisar outras oportunidades de negócios. Afinal, as crises também podem se converter em oportunidades de ganhos”, destacou o presidente mundial da Saint Gobain. Mais uma vez, pode-se dizer que não se trata de um discurso que “joga para a plateia”. Afinal, grupo francês desembarcou por aqui há 80 anos. “Neste período vimos momentos de crise e de bonança. Mas nunca deixamos de trabalhar duro e buscar saídas para seguir crescendo. Não seria diferente agora”, justificou de Chalendar.