Por Rosenildo Ferreira, especial para COALIZÃO VERDE (1 PAPO RETO e NEO MONDO)
Mesmo com um certo grau de pessimismo, especialmente pela ausência do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a Conferência das Partes (COP30) começa oficialmente nesta segunda-feira (10/11), em Belém, com motivos para comemorar. O primeiro deles foi a disposição de dezenas de líderes governamentais em ratificar compromissos relacionados à proteção de pessoas e do meio ambiente, em diversos campos, expressa na Declaração de Belém. O segundo foi a adesão ao Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF) idealizado pelo governo brasileiro com o apoio do Banco Mundial, cuja meta é arrecadar US$ 125 bilhões e que apenas em seu lançamento, na sexta-feira (6/11), garantiu US$ 5,6 bilhões em doações. O terceiro é a expectativa de que a infraestrutura da capital do Pará será adequada para receber um grande número de visitantes com demandas muito específicas, como chefes de estado, povos originários e quilombolas, além de empresários e ativistas em geral.
De acordo com diversos analistas, muito deste sucesso inicial se deve à estratégia desenhada pela diplomacia brasileira. É que ao inverter a agenda -- colocando na pré COP a Cúpula dos Líderes, que reúne os chefes de estado e de governo, evento que nas outras edições aconteceu nos dias finais da Conferência --, os debates poderão partir de consensos, facilitando a implementação de medidas pactuadas no Acordo de Paris, em 2015, e que deverão ser alcançadas em 2030. A principal delas é o financiamento da transição para uma economia livre do carbono emitido por combustíveis fósseis (petróleo e gás natural), além da recuperação e manutenção dos ecossistemas florestal e marítimo, acossados por ações predatórias. Decorridos 10 anos, a meta de investimento anual de US$ 300 bilhões está longe de ser alcançada, comprometendo, assim, os esforços para evitar que a temperatura do planeta se eleve acima de 1,5 ºC.
E este foi um dos principais tópicos do duro discurso proferido pelo secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, que cobrou dos líderes globais maior empenho para a adoção de medidas concretas, lembrando que o aquecimento global não é mais uma expectativa, mas sim de uma realidade presente. “Cada ano (com a temperatura) acima de 1,5 ºC afetará as economias, aprofundará as desigualdades e causará danos irreversíveis. Devemos agir agora, com rapidez e em grande escala, para tornar o excesso o menor e mais curto e o mais seguro possível. E trazer as temperaturas de volta ao limite de 1,5 ºC antes do fim do século”.
Apesar de ausente, o governo americano mostrou que não está alheio ao que acontece no coração da floresta amazônica. Fez isso por meio de uma publicação, no domingo (9/10) de um provocativo post nas redes sociais, acusando o Brasil e o governo do Pará de hipocrisia, por terem “devastado a floresta para construir uma estrada até Belém”. A afirmação, no entanto, não encontra eco na realidade. Afinal, no que se refere à Amazônia, faz tempo que os dados não são tão favoráveis. Quer sejam de fontes oficiais, quanto de centros de estudos independentes. “Ainda estamos muito longe da meta de desmatamento zero, defendida pelo governo”, diz o engenheiro cartográfico e agrimensor Ives Medeiros Brandão, técnico do MapBiomas, iniciativa ligada à Rede Amazônica de Informações Socioambientais Georreferenciadas (RAISG). “Mas, acreditamos que se trata de uma meta factível, especialmente se forem intensificadas as medidas atuais de preservação da floresta”. Ele cita como ponto crucial o combate à ação ilegal de garimpeiros, madeireiros e criadores de gado, que avançam sobre terras públicas e áreas de preservação permanente.
De fato, o efeito COP fez com que o governo do Pará, um dos estados com maior nível de desmatamento do bioma Amazônia, alterasse sua postura em relação ao tema. As ações se tornaram ainda mais efetivas a partir do trabalho do governo federal na proteção de terras indígenas e das comunidades quilombolas, consideradas vitais para a preservação da floresta de pé. Como 98,9% das áreas de vegetação nativa estão dentro de reservas administradas por estas comunidades, segundo o MapBiomas, defender a causa dos povos originários e tradicionais seria o caminho mais fácil para proteger a Amazônia. “Eles são os guardiães da floresta”, destaca.
No entanto, ainda há muito que ser feito. Afinal, no período 1984-2024, a floresta sofreu um violento impacto da ação predatória que resultou na perda de 52 milhões de hectares de formação florestal, o equivalente a 13% do total. O problema é mais agudo no chamado Arco do Desmatamento, que engloba os estados de Acre, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Rondônia e Tocantins, alvos da expansão de atividades antrópicas (como mineração, criação de gado, corte de madeira e agricultura), onde foram registrados 14% da perda líquida de vegetação amazônica. Apesar de parecer pequeno, trata-se de um percentual que se aproxima do nível de não retorno, fixado entre 20% e 25% de perda de cobertura vegetal, que é quando a floresta não consegue, por conta própria, se regenerar, segundo o MapBiomas.
Ultrapassar essa marca pode representar um custo ainda mais elevado para a recuperação da região, além de ampliar a intensidade e a frequência de eventos extremos, impactando os períodos de seca e de chuvas, que regulam as atividades econômicas. "O prolongamento dos períodos de verão já estão afetando inúmeras atividades na região".
Com informações de ONU Brasil e cop30.br
