ONU alerta para riscos sociais e ambientais na corrida por energia limpa

ONU alerta para riscos sociais e ambientais na corrida por energia limpa

Com o agravamento da crise climática, a demanda global por minerais críticos para tecnologias de energia limpa – como lítio para veículos elétricos ou selênio para células solares – deve triplicar até 2030 e quadruplicar até 2040, conforme dados da Agência Internacional de Energia (AIE).

Neste contexto, seria de se esperar que os países em desenvolvimento com grandes reservas de minerais essenciais para a transição energética, como Brasil, Congo e Bolívia, apenas para citar alguns, teriam a oportunidade de transformar e diversificar suas economias, criar empregos verdes e promover o desenvolvimento local. Mas isso está longe de acontecer.

Especialmente no que concerne aos povos originários e às populações de territórios ancestrais, como é o caso dos quilombolas, no Brasil. De acordo com levantamento realizado pelo Instituto Socioambiental (ISA), nada menos que 98,2% destes territórios estão sob ameaça de projetos de mineração, iniciativas do agronegócio ou obras de infraestrutura. O relatório alerta para o risco de degradação florestal dos 3,8 milhões de terras demarcadas para este grupo, dos quais 3,4 milhões estão conservados.

Esse alerta coincide com os alertas incluídos no recente Painel da ONU sobre Minerais Críticos para a Transição Energética, convocado pelo secretário-geral António Guterres. Durante o evento, foram apresentou princípios-guia e recomendações para garantir que a transição energética global beneficie plenamente todos os países e comunidades onde se encontram os minerais críticos, incluindo economias em desenvolvimento na África, Ásia, América Latina e Pacífico.

 “Países em desenvolvimento, como parceiros na transição energética, podem promover o desenvolvimento por meio de oportunidades de agregação de valor, compartilhamento de benefícios, diversificação econômica e participação nas cadeias de valor dos minerais críticos, que impulsionarão as próximas gerações, em vez de servirem apenas como fornecedores de matéria-prima”, destaca o relatório.

Sem o gerenciamento adequado, o aumento da demanda por esses minerais corre o risco de perpetuar a dependência de commodities, exacerbando tensões geopolíticas, além de representar desafios ambientais e sociais com impactos adversos sobre o desenvolvimento sustentável, inclusive sobre os meios de subsistência, o meio ambiente, a saúde, a segurança humana e os direitos humanos.

O Painel é composto por atores governamentais, da indústria e da sociedade civil, e recebeu apoio do Secretariado da ONU, liderado conjuntamente pela equipe de ação climática do Secretário-Geral António Guterres (foto), pelo Programa da ONU para o Meio Ambiente e pela ONU Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD). Outras 17 agências da ONU também forneceram aconselhamento técnico.

O relatório enfatiza a necessidade de justiça, equidade e sustentabilidade ao longo de toda a cadeia de valor dos minerais críticos – desde a mineração, refino e fabricação, até o transporte e reciclagem. Recomenda contratos justos e transparentes, uma governança sólida e a promoção de justiça econômica em parcerias comerciais e de investimentos mais equitativas.

O documento também destaca a importância de salvaguardas ambientais e sociais para evitar práticas de mineração nocivas do passado, e pede metas equitativas e cronogramas para implementar abordagens de eficiência de materiais e circularidade ao longo de todo o ciclo de vida dos minerais críticos para a transição energética.

Entre as recomendações, está a criação de um grupo consultivo de alto nível a ser organizado pela ONU para facilitar o diálogo sobre compartilhamento de benefícios, agregação de valor, diversificação econômica, comércio internacional e investimentos, e políticas fiscais, visando desbloquear o potencial dos recursos minerais críticos locais para um futuro sustentável.

As recomendações reconhecem o papel central do Secretário-Geral e da ONU como um mediador imparcial diante de diversos interesses e de um conjunto complexo e desafiador de questões para a transição energética e para alcançar os objetivos do Acordo de Paris.

Painel onu energia limpaVista aérea de mineração irregular na Amazônia / Foto: ONU (divulgação)

Como próximos passos, o Secretário Geral pediu aos Co-Presidentes e ao Painel que discutam o relatório e suas recomendações com os Estados-membros e outras partes interessadas antes da COP29 no final deste ano.

Contribuições contínuas

O órgão da ONU para o comércio e o desenvolvimento há muito tempo apoia países em desenvolvimento dependentes em minerais a agregar mais valor local, criar empregos de qualidade e reduzir a dependência de exportação de matérias-primas e a exposição à volatilidade dos preços das commodities.

Na preparação do relatório do painel, a ONU Comércio e Desenvolvimento liderou frentes de trabalho sobre agregação de valor local e compartilhamento de benefícios, bem como comércio internacional e investimento transparentes e justos.

Olhando para o futuro, a organização está comprometida em garantir que a equidade e a justiça moldem o mercado crescente de minerais críticos, e que a riqueza mineral seja um catalisador para o desenvolvimento sustentável, em vez de aprofundar as desigualdades.

Leia aqui a íntegra do painel em inglês

Com informações da ONU Brasil. Leia a íntegra aqui, em inglês.